Sociedade
Câmara de Leiria pede ao governo para travar prospeção de gás na Bajouca
O presidente da Câmara de Leiria considera que não faz sentido avançar com a prospeção de gás e pede ao Governo que resgate a concessão.

A Câmara de Leiria assumiu uma posição e vai pedir ao Governo para travar a exploração de gás nas Bajouca.
Segundo uma nota do município leiriense, Gonçalo Lopes enviou esta segunda-feira uma carta ao ministro do Ambiente e da Ação Climática a pedir o resgate da concessão de exploração de gás natural na Bajouca.
A ação “surge na sequência da carta que o ministro João Pedro Matos Fernandes enviou à jovem ativista Greta Thunberg, em que afirma que Portugal é um dos países europeus que mais sofre com as consequências das alterações climáticas”.
Ora se Portugal tem “uma estratégia nacional ambiciosa de adaptação às alterações climáticas”, o presidente da Câmara de Leiria considera que não faz sentido avançar com a prospeção de gás e pede ao Governo que resgate a concessão, considerando que os “custos desse resgate são reduzidos uma vez que ainda não foi feita prospeção”.
Na carta, o presidente da Câmara de Leiria deixa ainda um convite ao ministro do Ambiente para que visite a Bajouca, “que também é Europa e também quer continuar a ser verde”.
No documento, Gonçalo Lopes refere ainda que “não se pode aceitar que seja feita qualquer sondagem na Bajouca, que não representa qualquer vantagem para o país, seja ambiental ou financeira”.
No dia 22 de novembro, numa Assembleia Municipal organizada pela Junta de Freguesia da Bajouca, a vice-presidente da Câmara Municipal de Leiria, Anabela Graça, avançou que o “Município estava a definir uma estratégia de defesa dos interesses da população”.
Leia a carta aqui a carta na íntegra do presidente da Câmara de Leiria, Gonçalo Lopes, ao ministro do Ambiente, João Pedro Matos Fernandes.
Excelentíssimo Senhor Ministro do Ambiente
Eng. João Pedro Matos Fernandes
Leiria, 2 de dezembro de 2019
Excelência,
Foi com enorme satisfação que tive oportunidade de ler a carta que o Sr. Ministro enviou a Greta Thunberg, em que manifesta as suas preocupações com as alterações climáticas e o seu impacto no nosso País, uma visão que partilho na íntegra e que me levou igualmente a endereçar uma carta à jovem ativista ambiental e em especial esta missiva a V. Exa..
No que diz respeito às preocupações ambientais, não poderia estar mais alinhado com V. Exa.. Leiria, a região que represento, enquanto presidente da Câmara Municipal de Leiria, é o exemplo máximo desse impacto.
Nos últimos anos, têm sido múltiplos os fenómenos extremos que nos têm assolado: O avanço do mar na costa, em especial na nossa Praia do Pedrógão em 2013; o trágico incêndio do Pinhal de Leiria em 13 outubro 2017; e a tempestade Leslie, que, dia 15 out 2018, deixou um profundo rasto de destruição nesta região.
O aquecimento global, um tema que se impõe na atualidade pelo seu impacto real, tem sido sentido de forma extrema em Leiria.
Aliás, se juntarmos a estes fenómenos a poluição da Bacia do Lis, com origem maioritariamente no setor agropecuário, podemos dizer que Leiria tem, ao longo dos últimos anos, sido profundamente afetada pela poluição.
Para agudizar esta crise ambiental, fomos confrontados com o dossiê da concessão para pesquisa, prospeção e exploração de gás na Bajouca, uma freguesia deste concelho, que fica no epicentro dos fenómenos climáticos que descrevi anteriormente.
Se a globalidade dos portugueses admite a exploração do lítio, incluindo ambientalistas, por representar uma opção energética do futuro, já o caso do gás é difícil de entender ou defender por quem se comprometeu com a construção e uma Europa verde.
Num país que traçou para si próprio metas ambientais ambiciosas, esta posição é um contrassenso.
Efetivamente, o gás tem os dias contados.
Se até há poucos anos era encarado como uma fonte de energia de transição, hoje, face à agenda ambiental com que nos estamos a comprometer, são cada vez mais as vozes defensoras de que o gás deve ficar também de fora das nossas prioridades.
Sabemos que esta concessão na região de Leiria foi atribuída em 2015, no final do mandato do XIX Governo Constitucional de Portugal, de uma forma atribulada.
Dessas concessões, já caíram as do petróleo, restando duas de gás.
Nestes cinco anos, muito se evoluiu em termos de políticas e ambições ambientais.
Tive sempre um cuidado muito especial em proteger a posição da Câmara Municipal de Leiria para que não existisse aproveitamento político e para minimizar o populismo e o radicalismo que ameaçam o equilíbrio com que deve ser liderada uma autarquia.
Hoje, depois de ler a sua carta dirigida a Greta Thunberg, não tenho dúvidas de que temos de pôr fim a esta concessão.
Nas últimas semanas temos trabalhado com especialistas e investigadores sobre a posição que devemos adotar no âmbito da Avaliação do Impacto Ambiental desta concessão de gás.
A posição destes é unânime: A exploração de gás na Bajouca, ou em qualquer ponto do país, não faz sentido para quem quer descarbonizar Portugal.
Por isso, não podemos aceitar que se faça qualquer sondagem na Bajouca. Esta exploração do gás não é solução para Portugal, seja do ponto de vista ambiental ou financeiro.
Aliás, a exploração de gás nesta localidade não representaria qualquer vantagem para o consumidor português, que continuaria a ter de suportar a mesma fatura energética.
Para o Governo, a compensação a receber seria, além de diminuta, fracionada em montantes irrisórios ao longo de dolorosos anos de exploração.
A população da Bajouca, tal como a liderança da junta de freguesia, e das localidades vizinhas, está contra a prospeção e exploração e prometem uma oposição firme, que entendemos legítima.
Considero que o Governo que V. Exa. integra deve aproveitar esta grande oportunidade para afirmar que não quer a exploração do gás e resgatar a concessão. Os custos desse resgate são reduzidos uma vez que ainda não foi feita prospeção.
Acredite, só temos a ganhar com esta decisão.
Portugal deseja, dentro de poucos anos, ser o primeiro país a alcançar a ambiciosa neutralidade carbónica. Mas essa meta, traçada para 2050, não é compatível com a existência de explorações de gás no nosso país.
A nossa aposta deve ser nas energias de natureza renovável, como, de resto, está previsto nas linhas de apoio comunitárias.
A terminar, deixo a V. Exa. um convite para visitar a Freguesia Bajouca, que também é Europa e também quer continuar a ser verde.
Subscrevo-me com consideração e estima pessoal,
O Presidente da Câmara Municipal
Gonçalo Lopes
